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Abre-Alas: reflexões de uma mulher em alto voo

Por Cristina Benedita

Esta Oficina proporcionou um encontro entre pessoas de várias gerações, idades, experiências e visões (de águia!!...) que não teriam sido possíveis sem esta abertura e convivência. Foram dias intensos, em que entrei logo chegada de Lisboa, quase diretamente do avião para a sala verde...


Fomos experimentando caminhos internos, explorações de energia, tomadas de ação e de direcionamento das mesma, com uma entrega que há muito não sentia num grupo tão grande, num mesmo lugar em partilha e dedicação.
Conseguimos, num todo, com uma vontade forte, seguir caminhos, sempre com aquela demanda, importante aliás, que o Rickie e a Cris nos pediam (ou que nos alertavam para ela): ver, o que está fora, assim como sentir o que está dentro. A energia da agua, da pedra, da pantera, da força motriz em cada um de nós, da fluidez de movimento, da continuidade ou paragem (parada) na forma e no corpo, numa suspensão de um tempo que se pousa nesse instante. A percepção, a atenção, a intenção, a autenticidade da (in)constância do corpo, no corpo de cada um, do ser de cada um, em cada um, corpo.


Os propósitos dos primeiros quatro dias foram, para mim, na minha opinião e experiência, muito louváveis e intensificadoras daquelas pessoas e suas possibilidades e capacidades, sem desmérito em relação a nenhuma outra pessoa. Cada criatura, saindo de dentro de cada alma, sem comparação com a outra, numa individuação própria e respeitadora de cada especial vivência, de cada pessoa em si mesma e em relação com a outra.


Os dias que foram de montagem do Abre-Alas terei de dizer que foram um pouco cansativos, não porque houvesse um carregamento maior da energia ou da espera, que são próprios de uma montagem nova, mas pensei que nos confiassem mais a co-criação mesmo das estruturas. Habituada ao desenvolvimento de muitos anos de uma Europa multicultural, sei que há bastante aproveitamento do tempo nessa qualidade de confiança no intérprete, como criador, tanto de sua personagem como de toda o envolvimento do processo. Não estou com isto a queixar-me, mas dando a minha humilde opinião, mas sublinhando que toda uma forma de crescimento tem esse risco. A forma foi preservada, mas os Céus, no momento da apresentação rebentaram suas águas e deixaram-nos á mercê da nossa responsabilidade e ação, com um aviso de nos propormos senti em percepção e em 'arranque' de uma possível integração desta ideia, que como profissional do corpo, do teatro/voz e da dança, sei que é possível. Possivelmente fica aqui esta reflexão para posteriores elaborações e projetos públicos, numa ponte entre o que se passa no estúdio, na sala de ensaios, no espaço recolhido e na exposição pública, que poderia ter sido de grande ajuda, embora eu entenda que nem tudo pode caber numa 'rua' tão pequenina como uma 'semana'. Gostaria de saber mais opiniões pois essa parte de conversarmos sobre cada momento, ficou um pouco aquém, quase um golpe de asa, como diria o poeta Mário de Sá-Carneiro...


Beijos e levem estas críticas como comunicação e não como um 'apontar de dedo'. Pretendo saber o que sentem, o que pensam, o que acham, o que vos vai na alma, e o que se pode pôr em prática por expressarmos isso de modo aberto (não muito usual em Portugal também, mas bastante usual numa Europa do Centro e do Norte que visito frequentemente e para onde viajo profissionalmente em muitas partilhas de projetos).
 

Sempre ao dispor...





Carlos Simioni
LUME Teatro
A Presença do Ator com 

Carlos Simioni



Uma reflexão por George Holanda










No primeiro dia de oficina, Simioni nos mostrou duas formas de caminhar. No primeiro, ele possuía uma energia cotidiana, sem força, vazio. Já na segunda, ele estava tão preenchido de energia, havia uma intensidade na sua presença que não conseguíamos não olhar pra ele. Ficou claro que aquele segundo caminhar resumia o trabalho daquela oficina. Trabalhar uma energia para o ator, a construção dessa presença.











Contudo, atingir aquele qualidade de energia parecia ser algo impossível e distante para nós. Mas "como todo bom mestre, ele dá as ferramentas para seus aprendizes". E assim ele começou a nos ensinar os passos para construirmos essa nossa presença. Dia após dia passamos por vários exercícios. E não foi fácil, pois o trabalho consistia em exercícios físicos exaustivos. Mas existia também um indisfarçável prazer em descobrir novos limites para o nosso próprio corpo. E, dessa forma, íamos nos lançando nesse vôo, como Simioni gostava de falar.

















Ao final da oficina, senti que realmente havíamos chegado a um lugar. Um primeiro ponto de uma longa caminhada. Esse trabalho me lembra a subida de uma colina, que após chegar ao seu topo vê-se que existem muitas outras colinas para subir e que a visão não alcançava até então. 


Uma caminhada de infinitas descobertas e trabalho árduo.










E foi assim que entendemos no nosso próprio corpo aquela caminhada de Simioni no primeiro dia de oficina. Estávamos cientes de um novo código de trabalho. Falávamos uma nova língua. Uma língua do corpo. Havíamos descoberto caminhos que nos possibilitavam a construção dessa presença, desse corpo diferenciado do ator. A partir daquele momento, um novo desafio se apresentava para nós, a continuidade do trabalho longe dali, nas nossas realidades. O conforto para enfrentar esse desafio é que temos gravado na nossa memória corporal este caminho.






Raquel Scotti Hirson:

“Fiquei confusa, Raquel, você propôs um exercício no qual quanto mais longe o olhar, mais próximos estávamos das memórias longínquas. Essas memórias não estão bem dentro de nós, no fundo?”







A dúvida de uma aluna, mais ou menos nessas palavras, realçou o quanto a Mímesis Corpórea dialoga com a memória. Mímesis e memória são criações. Que lugar é esse da memória? Posso sim me aproximar de um outro, lançar meu olhar sobre um outro, ou seja, sair de mim, para chegar mais perto de mim mesma. Lançamos o olhar para fora de nós para encontrarmos ecos do futuro no passado. O lugar de encontro, que conseguimos detectar e perceber, é o corpo-pensamento, mas o lugar da memória pode ser sim um olhar que se lança no futuro.

Neste curso lançamos nossos olhares para o Dorival, a Ivânia, a Bete, o Duda e tantos outros. Fisgamos imagens da dança de Kazuo Ohno, de esculturas de Camille Claudel, do cotidiano de Maria Alves. Nos embrenhamos nas entranhas de árvores mortas, postes de luz e lixeiras de ferro e adentramos em imagens construídas por Carlos Drummond de Andrade, Alberto Caeiro, Cora Coralina, etc. Chegamos em Ana Clara, Ernani, Fabíola, Gabriela, Jordana, Kamilla, Lu, Marianna, Thiago, Lissa e Fabiana.

A observação de algo externo a eles os fez mais próximos da percepção de suas ações, tensões, respiração e, principalmente, da criação que cada um deles está disposto a realizar, cada qual em sua cidade, alguns com seus pares e outros sozinhos em suas escolhas, mas muito bem acompanhados pela vastidão de possibilidades que a Mímesis Corpórea nos dá.

Raquel Scotti Hirson – Mímesis Corpórea – 29/01 a 03/02/2013

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